Aquecimento Oscar 2024: Pobres Criaturas é uma verdadeira aula de autoconhecimento e de amadurecimento.

Por mais bizarro que o longa de Yorgos Lanthimos pareça ser, é nessa estranheza que a realidade se faz presente. Pobres Criaturas que é baseado num romance de mesmo nome, conta a história de Bella Baxter, uma invenção de Godwain Baxter (Willem Dafoe), ela faz parte de um experimento do famoso cirurgião no estilo Frankenstein. Com o passar do tempo a criatura começa a entender melhor sobre si mesma e procura expandir seu conhecimento para aprender sobre o mundo. Quando o advogado Duncan Wedderburn (Mark Ruffalo) faz uma proposta de uma viagem, Bella prontamente aceita e então sua jornada começa. Conhecer os prazeres do mundo também possibilita a criatura de conhecer os desprazeres humanos, que são tão presentes em nossa realidade.

A produção audiovisual nos introduz num cenário completamente bizarro e estranho. Quando o Dr. Godwain Baxter resgata o corpo da jovem Bella Baxter e faz a troca de cérebros toda a narrativa começa a fazer muito sentido, afinal, estamos acompanhando uma mulher adulta, mas com sua mentalidade ainda em desenvolvimento. No início, a imagem em preto e branco e a forma da protagonista de se comunicar é bizarra, nos lembra exatamente os hábitos de uma criança, quebrando coisas, falando com dificuldade, andando de forma engraçada e por fim curiosa, querendo entender tudo a sua volta.

Quando Bella começa a se desenvolver melhor e conhece o seu próprio corpo, toda a narrativa muda, é aberto um mundo de possibilidades. A criatura percebe que precisa sair daquele local, precisa explorar o mundo, pois, aquela casa se tornou pequena para a sua pequena mente. Dali em diante o amadurecimento de Bella começa a ser notado. O fato de a criatura reconhecer sensações diferentes a partir do sexo, mostra para nós a necessidade do autoconhecimento. Precisamos nos conhecer, nos entender para que possamos entender o próximo.

Em viagem com o advogado Duncan Wedderburn (Mark Ruffalo), a protagonista passa a explorar cada canto desse mundo e a partir de seus conhecimentos, também explora o prazer da carne. Em diversos momentos ela se coloca como a própria autora de sua história, não permitindo que outros possam ditar as regras de suas ações. Ainda que Duncan seja o seu “tutor”, percebemos que ele não possui nenhum controle sobre Bella.

Por mais que sua mentalidade esteja em desenvolvimento, Bella se permite em conhecer tudo, se permite em experimentar o que há de melhor a cada nova descoberta. Enquanto a criatura se desenvolve, os demais personagens permanecem em seus mesmos propósitos, não há desenvolvimento, isso mostra como um adulto pode ser ignorante. Por mais que o cérebro esteja desenvolvido e amadurecido, ele não se permite ter novos conhecimentos, não se permite compreender como o mundo funciona e isso torna Bella muito mais amadurecida do que todos ali.

Para muitos a quantidade de cenas de sexo pode gerar um incômodo, mas existe a necessidade dessas cenas existirem ali. A cada nova relação sexual a nossa protagonista se mostra muito mais amadurecida. Quando Bella percebe a necessidade de utilizar seu corpo para sobreviver também entende que a relação sexual não precisa ser tão fria e desgostosa. Neste momento vemos que a personagem propõe novas formas de se relacionar, entendemos que a prostituição seja um tipo de serviço, mas ainda assim, estamos lidando com pessoas, estamos lidando com sentimentos e a intimidade alheia. O acerto de Bella neste quesito é fazer com que essa troca íntima seja mais amigável, que não seja apenas sexo por sexo, mas sim uma boa experiência para ambas as partes.

Duncan é aquele que tenta manter Bella sempre ao seu lado, se diz apaixonado pela pobre criatura, mas na realidade quer ter poder sobre ela. No final entendemos que a antiga vida de Bella pertenceu a uma mulher eu sofreu por alguma forma de prisão domiciliar, e aí entendemos a sua necessidade de estar livre. A todo momento que qualquer homem, Godwain, Max McCandles (Ramy Youssef), Duncan ou Alfie Blessington (Christopher Abbott), tentou limitar Bella de qualquer nova ação, ela deixa claro que sua liberdade não será afetada pelos desejos dos outros e que ela é quem dita as regras de sua vida.

Pobres Criaturas abre nossos horizontes e deixa claro a possibilidade de conhecermos nós mesmo, o próximo e o mundo. A descoberta de cada novo sentimento, a descoberta de cada nova face do ser humano, a descoberta de cada nova classe social nos coloca em reflexão, sendo ela, a necessidade de não sermos ignorantes e aceitar as coisas como são, podemos sim conhecer todos os lados de uma nova história, podemos sim conhecer novos caminhos e deixar com que nossas vontades e curiosidades nos transforme e nos amadureça cada vez mais. Ainda que sejamos adultos, estamos em constante evolução, não somos os mesmos de ontem e amanhã não seremos os mesmos de hoje. Assim como Bella, precisamos aceitar nossos valores, mas deixar aberta a possibilidade de explorar o mundo e a vida como se fosse uma curiosa criança em desenvolvimento.

Ao todo, foram 11 indicações ao Oscar nas categorias de Melhor Atriz, Melhor Direção, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Ator Coadjuvante, Melhor Trilha Sonora, Melhor Design de Produção, Melhor Fotografia, Melhor Cabelo e Maquiagem, Melhor Figurino, Melhor Montagem e Melhor Filme. A premiação acontece no próximo dia 10 de março e acredito ser um dos favoritos em diversas categorias, em especial nas de Melhor Filme e Melhor Atriz.

Pobres Criaturas está disponível nos cinemas.

Nota: 5/5